1.6.04

A dança cantada de luz das borboletas de intensos tons castanhos

Numa semi-penumbra dançavam borboletas escuras, intensos tons castanhos como se para transmitir inequivocamente uma mensagem. Parei a contemplá-las e o tempo passou e a noite tornou-se total. Não me conseguia mexer, sentia-me petrificado. Continuava a ver claramente as estranhas borboletas entretanto congregadas à minha volta mas a páginas tantas, porém, esqueci-me de questionar a veracidade da cena. Então, Oh erro fatal, a queda na(o) real.

As borboletas escuras desvanecem-se (ou engrandecem-se) num feixe vertical de luz. Devido à cuidada estratégica disposição, primando sempre pela anestesiante presença - círculo protegido pelos seus próprios extraordinários poderes - estou agora rodeado de feixes luminosos que percepciono como dourados. Constato, com uma acuidade inédita para os meus padrões, que são 21 e ei-los, rostos humanos tomando a palavra:


*
* (a tanga)

1 Acção de revolta iniciada
2 Por ti entreposta e definida
3 Acção pela qual a tua vida
4 Encontra mais um tudo e mais um nada.


* (a interposição de profundis)

5 Nós somos a voz dos pregadores
6 Que a história das raízes não aflora
7 Nós vimos da Ilha dos Amores
8 Directamente teus o aqui e o agora.


* (o eterno absurdo do sentimento de posse)

9 Não penses todavia que possuis todos os dias
10 Ou os sonhos por dizer que realmente existias
11 Pois perenes ocorrências contradizem-se de facto
12 E portanto equivalem-se a uma marca de tabaco.


* (meu insuportável perfume semântico)

13 Se a semântica te interessa e te afaga nas insónias
14 É mais um a-fuga-mento que criaste nas colónias
15 Aquosas ostentadas como cheiro verdadeiro
16 Todo o outro consideras - de visco os teus lábios - estrangeiro.


* (alento = 20 valores, nada melhor do que a escala da escola para completar o que é, afinal, uma tanga de profundis absurdamente insuportáveis)

17 De nomes és feito e nomes fazes
18 Palavras de vento ou tenazes tenazes
19 Toma pois o que te aprouver oh venerando ouvinte
20 O teu respigar é de “alento vinte”;


* (a trégua final enquanto fórmula ideal)

21 Paz no fim da forma do geómetra divino.

*

Livre de novo, ascendendo do real, retomada a policromia da película. É noite sim, mas são já candeeiros, caixotes do lixo, bancos de jardim e casas ao largo de onde me encontro. As borboletas de luz maximamente concretas porque maximamente abstractas comunicaram comigo e partiram, entre a semi-penumbra primordial e o momento presente ter-se-á expirado talvez uma hora e meia. É tempo de tornar ao caminho.

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